No tocante ao livro “Platão em 90 minutos”, de Paul Strathern.



O livro Platão em 90 minutos, de Paul Strathern, foi publicado pela Editora Zahar. A publicação em pdf foi encontrada de forma gratuita no site “Farofa Filosófica” (https://farofafilosofica.wordpress.com/), possuindo 22 páginas. A obra é disponibilizada pela equipe Le Livros com o objetivo de uso parcial em pesquisas e estudos, acreditando que o conhecimento e a educação devem ser acessíveis e livres a toda e qualquer pessoa. A edição do livro em português teve a tradução autorizada da primeira edição inglesa, publicada em 1996 pela Constable, de Londres, Inglaterra.

Paul Strathern nasceu em Londres em 1940. Estudou filosofia no Trinity College de Dublin, tornando-se um escritor e acadêmico autor de biografias, romances e livros de histórias e viagens. Em 1973 conquistou o prêmio Somerset Maugham (prêmio literário britânico anual atribuído pela Sociedade Britânica de Autores), com o romance Season in Abyssinia. Tornou-se mais conhecido pela autoria das séries populares Filósofos em 90 Minutos e Cientistas em 90 Minutos. Atuou como jornalista para os jornais The Observer, Daily Telegraph e Irish Times; e ensinou filosofia e matemática na Kingston University.

O assunto abordado pelo livro é a vida e a obra de Platão. De forma resumida, traz as principais ideias do filósofo, bem como a origem do seu pensamento. Platão ambicionava tornar-se um lutador profissional, mas não conseguiu chegar às Olimpíadas. Tentou a sorte então como poeta trágico, mas não venceu nenhum dos grandes concursos. Como filósofo, foi um dos principais pensadores gregos, fundando um raciocínio metafísico próprio, elaborando uma teoria dualista com dois mundos: o das ideias e o dos sentidos. Foi inspirado pelas teorias de Parmênides acerca do imobilismo.

A seguir, será realizada uma exposição sintetizada do livro “Platão em 90 minutos”, de Paul Strathern, com algumas opiniões e reflexões sobre conteúdos específicos da obra.

Na primeira parte do livro, que traz a introdução e as raízes das ideias de Platão, o autor expõe que alguns pensadores modernos querem que as pessoas acreditem que o filósofo foi a ruína da filosofia, pois esta nunca se recuperou das reflexões feitas por ele e por Sócrates no século V a.C., ao tratá-la como uma investigação racional, destruindo tudo com a introdução da análise e do argumento irrefutável. Embora não tenha escrito nada, Sócrates, que possuía uma ingênua crença ética de que “os bons são felizes”, exerceu forte influência no pensamento de Platão, que entendia que “apenas os injustos são infelizes”, sendo constatada nos próprios escritos de Platão, no qual Sócrates aparece como um personagem nos textos.

Além de Sócrates, pode-se destacar a influência que Platão sofreu de Pitágoras, Heráclito, Demócrito e Xenófanes. O primeiro contribuiu com a ideia de que “tudo é número”, que havia um mundo abstrato e harmonioso dos números, indo além do mundo confuso das aparências. Pitágoras foi mais do que um filósofo, foi um matemático, líder religioso e místico, mesmo não deixando nada escrito. O segundo marcou pela crença de que tudo era fluxo, declarando que não era possível entrar duas vezes no mesmo rio. O terceiro insistiu que o universo é composto por átomos, dois mil anos antes dos cientistas decidirem que estava certo. O último declarou que “nenhum homem conhece, ou conhecerá algum dia, a verdade acerca dos deuses e de tudo”.

Ao tratar da vida e da obra de Platão, Paul Strathern informa que o filósofo, cujo nome era Aristocles, foi um atleta de ombros largos que nasceu em 428 a.C., sendo membro de uma família política que descendia de Codro, o último rei de Atenas. Além da vida de atleta, tentou ser um poeta trágico antes de enveredar pela filosofia, quando tornou-se um discípulo de Sócrates, absorvendo as suas ideias. Não se limitando a estas ideias, resolveu viajar por uma década, buscando aprender com o mundo. Com o passar do tempo, desenvolveu-se o platonismo, movimento no qual alguns de seus praticantes concluíram que embora a filosofia de Platão estivesse correta, o próprio filósofo, com frequência, não sabia sobre o que estava falando.

Baseado nas descobertas de Pitágoras da relação entre o número e a harmonia musical, Platão acreditava que os números continham a chave da compreensão do universo. O elemento central da sua filosofia é a Teoria das Ideias (ou das Formas), na qual o mundo físico, que é percebido com os sentidos, está em contínuo estado de mudança, diferente do reino universal das Ideias, que é percebido pela mente, sendo imutável e eterno, possuindo uma hierarquia que parte das formas menores para as mais rarefeitas e abstratas. Para Platão, com o uso racional da mente é possível apurar as noções das Ideias universais e começar a retê-las melhor e alcançar a Ideia de “bem”, com uma iluminação espiritual.

Platão entendia que a alma humana era constituída por três elementos distintos. Um era o elemento "racional", que esforçava-se por obter conhecimento. O outro era o "espiritual" ou espírito ativo, que  buscava conquista e distinção. O último era o "apetite", que procurava a satisfação. Esses elementos repercutiram nos três elementos da sociedade descrita na obra “A República”: os filósofos, os homens de ação ou soldados e a ralé.

Aos olhos de Platão, a democracia estava tingida com as mesmas cores da tirania. Nesse sentido, em obras como A República, é possível verificar ideias como liberdade de expressão, feminismo, controle de natalidade, propriedade pública e privada e outras. Platão entendia que na república ideal não existiriam propriedades e nem tão pouco casamentos. As crianças seriam tiradas de suas mães logo após o nascimento e educadas comunitariamente, considerando que o Estado seria seus pais e que todos os contemporâneos seriam irmãos e irmãs. Logo, é possível observar várias “sementes” de um regime totalitário, travestido de um ente com o propósito de promover o bem comum.

A Academia é um aspecto marcante na história e no pensamento de Platão, tendo sido iniciada em 386 a.C., com a compra de um lote de terra nos Jardins de Academos, a noroeste de Atenas, nas antigas muralhas da cidade. Ao abordá-la, Strathern informa que ela reuniu um grupo de seguidores de Platão que incluía várias mulheres. A Academia floresceu em Atenas até ser finalmente fechada pelo imperador Justiniano em 529 d.C , em sua tentativa de abolir a cultura helenista pagã em favor do cristianismo.

Em sua abordagem sobre a educação pensada e promovida por Platão, o autor expõe o pensamento do filósofo no sentido de buscar fundamentar um sistema político na capacidade intelectual dos indivíduos. Nesse contexto, a pessoa que chegasse aos vinte anos demonstrando insuficiente apreço pelos exercícios físicos e pelas orquestras de metais seria eliminada e encaminhada para executar tarefas que considerava menores, como ser fazendeiro ou ser negociante, para garantir o sustento da comunidade. Numa segunda fase, após estudar aritmética, geometria e astronomia por dez anos, um segundo grupo seria descartado e enviado aos quartéis. Os que restavam passavam a estudar filosofia para depois dedicarem-se ao estudo prático dos assuntos de governo.

Vencida todas as fases educacionais, o indivíduo estaria apto para governar. Strathern destaca o fato dos filósofos-governantes viverem juntos em acampamentos comunitários, sem quaisquer bens, desprovidos de interesses pessoais, para que ficassem imunes à subornos. Desse grupo era escolhido o chefe do estado, o filósofo-rei. Além disso, deixa claro que para Platão a resposta para garantir a ordem estaria em uma sociedade controlada com rigor, na tentativa de impor uma sociedade justa para que todos vivessem bem. Esta visão autoritária, aristocrática e elitista contribuiu para o desenvolvimento de ideologias como a comunista, a nazista e a facista.

Para Platão, a menos que os filósofos se tornem governantes ou que os governantes estudassem filosofia, os males da humanidade não teriam fim. Strathern revela que, na prática, aconteceu precisamente o contrário. Os governantes inspirados por ideias filosóficas causaram muito mais problemas do que os totalmente ignorantes em filosofia.

No posfácio do livro é possível verificar que o platonismo (filosofia de Platão), que floresceu na Academia, espalhou-se com o Império Romano, mas se afastando da sua forma mais pura, resultando em um neoplatonismo, que enfatizou os elementos místicos do platonismo e entrou em conflito com o cristianismo. O neoplatonismo atraiu Santo Agostinho que conseguiu harmonizar a filosofia de Plotino com a teologia ortodoxa cristã, dando ao cristianismo um alicerce intelectual firme e tornando-se parte da tradição cristã.

Entre as citações-chave é possível destacar a do Livro VII, 18 b-c, da obra A República que expõe que “o poder e a capacidade de aprender já existem na alma”, e que “a faculdade de conhecer só pode apartar-se do mundo das coisas contingentes por meio de um movimento da alma inteira”. Por sua vez, em Cartas, IV, 321c, é exposto que um temperamento arbitrário tem como companhia a solidão.

A obra de Strathern traz, ainda, uma cronologia de datas significativas da Filosofia, iniciando no século VI a.C., com o início da filosofia ocidental, com Tales de Mileto, e a morte de Pitágoras. A cronologia é concluída com a publicação póstuma de Investigações filosóficas, de Wittgenstein, o auge da análise linguística. Com relação à Platão, pode-se destacar a fundação da Academia de Atenas, primeira universidade, em 387 a.C., aproximadamente, bem como o seu fechamento pelo imperador Justiniano, marcando o fim da era greco-romana e o início da Idade das Trevas. Verifica-se, ainda, datas de acontecimentos relacionados a filósofos como Sócrates, Aristóteles, Santo Agostinho,Tomás de Aquino, Copérnico, Galileu, Descartes, Spinoza, Newton, Locke e Kant, entre outros.

No decorrer de sua vida e obra, Platão escreveu sobre diversos temas, como amor, amizade, política, justiça, imortalidade da alma, entre outros. Entre 409 a.C. e 404 a.C., Platão lutou na Guerra do Peloponeso, período final das batalhas entre Atenas e Esparta, tendo vivenciado o período denominado Tirania dos 30, quando o regime democrático ateniense deu lugar à tirania oligárquica dos modelos espartanos. A influência de Sócrates sobre Platão é tão grande que a maioria dos textos deixados por Platão é feita de diálogos em que Sócrates é o personagem principal. Na sua obra A República Platão apresenta as suas teses sobre a política e o que ele considera como justiça, enquanto conceito puro, eterno e imutável.

Em síntese, a visão que Platão tem da república ideal parece ter sido estruturada como um produto de sua época, o ambiente em Atenas, a experiência na guerra e vivência em uma tirania. Em sua concepção, o verdadeiro conhecimento só poderia ser apreendido pelo intelecto e não pelos sentidos. Nesse pensamento, a mente deveria retirar-se do mundo empírico para alcançar a verdade. O platonismo influenciou vários outros filósofos e políticos, que utilizaram a sua visão de mundo e de política tanto para aprimorar regimes políticos como para estabelecer teorias e regimes autoritários e autocráticos.

O que começou como números em Pitágoras iria tornar-se formas ou Ideias puras na filosofia de Platão. Este filósofo acreditava que tudo o que se percebe ao redor, sejam objetos, alimentos ou pessoas, entre outros aspectos da experiência cotidiana, são mera aparência, não representando, necessariamente, a realidade, que só poderia ser apreendida por meio de uma iluminação espiritual decorrente da moral, não por regras particulares de conduta. O pensamento e a filosofia de Platão influenciaram a humanidade por mais de um milênio, principalmente a sociedade medieval, com suas classes inferiores, sua casta militar e seu clero poderoso, guardando uma semelhança marcante com a república de Platão.

Por fim, pode-se afirmar que o pensamento filosófico de Platão decorreu de uma rica e variada tradição, tendo uma natureza essencialmente transcendente, evoluída e consolidada nos espaços fornecidos para a discussão e para a interpretação, o que possibilitou que se tornasse duradoura. Devido a estes aspectos, a filosofia e o pensamento de Platão tornaram-se aceitos pelo cristianismo.

Para aprofundar e detalhar mais as ideias apresentadas neste texto é importante que se busque a leitura completa do livro "Platão em 90 minutos", de Paul Strathern, bem como conhecer um pouco mais sobre o autor. Para ambas atividades é possível encontrar material na internet.

STRATHERN, Paul. Platão em 90 minutos. Editora Zahar. Disponível em: https://www.mediafire.com/file/75y0q3b2ecdwrmw/Plat%25C3%25A3o.pdf/file. Acesso em: 10 out 2021.

PAUL STRATHERN. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2022. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Paul_Strathern&oldid=64313811. Acesso em: 31 ago. 2022.

PORFÍRIO, Francisco. "Platão"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/platao.htm. Acesso em: 30 maio 2024.


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